quarta-feira, 17 de março de 2021

SEM TÍTULO (DISTANTES, FALAM CÃES.)

Distantes, falam cães.

Mais próximas, pessoas latem.

Nos latidos, ruídos de fala,

Projetos de articulação

Fazem coro com os que emito

Abrindo os olhos com o lento ritmo

Do sol nascendo, coral.

São diversificados os ritmos da vida.

Já disseram: inumeráveis.

O pentâmetro iâmbico dita

A mastigação, a natação?...

Quem o sente, sem sequer conhecer?

Principalmente sem sequer conhecer.

Os ingleses tentam, tentaram.

Troqueus, espondeus,

Cesuras alexandrinas.

Tais ritmos movimentam a vida,

Cadenciam a respiração,

Organizam-na junto ao universo

Em uma bela e metabólica ilusão.

Quais os ritmos das falas dos cães

E dos latidos dos homens?

E das mulheres?

Para quem as redondilhas maiores,

E as menores, e os heroicos e os sáficos?

Sobretudo inumeráveis são os ritmos.

Permaneço lento como o sol matutino,

Tentando despertar,

Mas quase livres, quase brancos.

 

quarta-feira, 10 de março de 2021

HOMEM CONTEMPORÂNEO


Cozinha, lava,

Passa, limpa

Com ela.

No domingo,

Bate o bolo

(E bate nela).

terça-feira, 9 de março de 2021

SEM TÍTULO (DE UM MOURISCO ENTIBIADO,)


De um mourisco entibiado,

O risco no telhado

Brilha baço, falso, e faúlha

Dois fósforos acima do faro.

Mira a lua, farol

Do mar noturno,

E salta distante e alto.

No outro telhado, ao lado,

O som assusta

Quem de repente está acordado

Imaginando um assalto.

Mas só queria assaltar a lua.

O gato.

sexta-feira, 5 de março de 2021

OSMOLÓGICA


A orquídea exala quase abrupta,

Nascitura precoce na noite escura

De odor que persiste na pele musga

De tudo o que não existe e rusga

No olfato do jardim de ninguém,

Olorosa catadura que gradua as camadas

De sonho que cataratam meus olhos

De luz soturna. Uma inalação musgo,

Azul-marinha marinando o sonho

Em camadas com a temperança

De ondas vagas, saturnas, aniladas.

Sigilo, silêncio, cismação, vagor,

Plantio de passos compassados

Em um equilíbrio que já não intui

Futuro, presente, passado.

Jardim além, jardim fantasma,

Aterrissa até que na terra haja,

De terreno, pouco ou quase. Ou nada.