quarta-feira, 27 de julho de 2016

SEM TÍTULO (UM CASTELO DE GELO)

Um castelo de gelo
Se arrepia nos cabelos.
A luz vinha da uva,
Às margens de uma cesta,
Vinha como um chamariz
Intumescido, suculento,
Acalorando o frio.
Uma abóbada de gelo,
Translúcidos abrolhos
Como setas nos olhos:
O velame vinhoso da luz
Os derreterá, como um chafariz
Ensonolescendo a tarda raiz
De uma praça de interior.

quinta-feira, 21 de julho de 2016

SEM TÍTULO (NO ESCURO, UMA LUZ PARAPLÉGICA,)

No escuro, uma luz paraplégica,
Um brilho lento,
A agressividade de uma microcosmogonia
Suave resplende.
Mas nada se expande,
Só uma luz aqui, um brilho ali esplende;
Um lume meio nume que, parcimonioso,
Não se entende a não
Ser como uma parte
Menos escura da escuridão.

quarta-feira, 20 de julho de 2016

ORAÇÕES

I

Todos os santos serão tragados por vaginas de fogo.
A voz do colibri ornamentará as arestas do dia.
Mas nada irá salvaguardar a vegetação dos bezerros púberes.

II

Todos os elementos da natureza têm vontade de matar.
Toda criação tem uma mão para carícia e outra para arranhar.
Deus é o lance de dados, que não abole o acaso.

III

A caridade é uma mãe ingrata.
Seu coração contém desolados vermes.
Se comer alguns, serei um homem sagrado. 

segunda-feira, 18 de julho de 2016

SEM TÍTULO (A FELICIDADE DE UM CORPO DESNUDO.)

A felicidade de um corpo desnudo.
Sua luz que traça um horizonte trançado, inescrutável.
Seu horizonte inescrutável que retorna
Como materialidade e seu fantasma.
Seu fantasma que é um rasgão
No seio da temporalidade,
No seio do próprio corpo,
Horizonte temporão
Que é a felicidade
Com toda sua gama de pavor.

terça-feira, 12 de julho de 2016

RUA SUJA

A multidão se alicia e se distancia
No seu cerne multitudinário.
A multidão se contradiz
E nega a contradição
Para revelar a diferença
(Em seu fundo de opacidade).
Quantas relações na multidão?
O que se passa no subterrâneo?
Que espécies novas de amor?
Que agenciamentos do desejo?
O desejo é ilimitado.
O ph ácido da vagina
De um corpo anônimo
(Um gigantesco corpo anônimo)
Garante a performação
De uma boca anônima
Que degusta uma fruta ácida.
A língua, suave dedo molhado,
Gesticula uma masturbação tântrica
(O Ocidente de repente oscila).
(Bombas explodem no aperto
De peitos e seios,
Que talvez estejam juntos em hospitais).
Como um grito de prazer e morte,
Revolta e orgasmo sujam as ruas.
Não haverá como limpar.  

terça-feira, 5 de julho de 2016

SEM TÍTULO (UMA ORGIA DE FOLHAGENS)

Uma orgia de folhagens
Compassada, cadenciada
Pelo sono sonâmbulo do vento.
O amor canibal da sombra
Superprotege a luz, a esconde.
Como um preâmbulo mal cozido,
Um homem de roupa social
Atravessa a folhagem (na cidade).
Não sabe que parte de seu corpo
Jantará (ele não é performer).
Se tudo correr bem, lavará
Seu obediente pênis cristão
Antes de adormecer.