quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

SEM TÍTULO (A MENINA BEM NOVA)

A menina bem nova

Com coleira no pescoço

(Protótipo de uma paródia

Empoderada de uma submissa

A si mesma)

Poderia estar morta

Logo após a calçada

Se uma sirene não gritasse

Que o entregador de moto

Fosse atropelá-la.

Não é precarização da imagem,

Nem über-imagem

Da contemporaneidade uber.

A noite e a luz da moto

Podem gerar uma voluptuosidade

Futuro-barroca

Ou alguma flexibilização

Do nosso tempo, nunca só nosso?

É possível.

Uma imagem pode

Ser conduzida a sua história,

À história das imagens,

A sua sobrevivência.

Ou pode brilhar sua pregnância

No escuro da falha da cronologia.

Quanto à menina,

Sabe-se lá o que a espera

Em outra esquina.

Sirenes podem ajudar ou atrapalhar.

Viva ou morta,

Viverá sua vida.

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

NA NET (DE DIA)

De dia,

Cancela o machista,

O predador.

Esquerdomacho? Jamais.

De noite,

Espanca a ex-companheira.

É de deixar louco

Quem não o quer mais.

 

De dia,

Reivindica os direitos putrans.

De noite,

Transmite o vírus

Da indiferença

Após não pagar

A hora de amor.

 

De dia,

É branco sem orgulho,

Da negritude defensor.

De noite,

A própria cor da noite

Lhe causa temor.

 

De dia,

Exalta o revolucionário

Corpo dos pobres

- KorpoBraz! -

De noite,

Pisoteia o mendigo

(Sem querer!)

E não olha para trás.

 

De dia,

Cancela o machista,

O predador.

De noite,

Com arroxeada noite no olho,

Tem de passar pano

Para o próprio agressor.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

SEM TÍTULO (UMA POLÉCULA DE ARANHAS,)

Uma polécula de aranhas,

Uma criança, um serial killer

Tentam adentrar o poema,

Criar interconexões.

Ao menos, adentrar com vigor

O cerne do poema.

Basta uma película de gesto,

De voz, de sombra

Para que se desassombrem,

Aprendam, enredem e matem.

O poema é uma teia, um jogo,

E um enigma de thriller.

NEVERMORE

Comunitas de anônimos,

Como um rizoma,

Uma família infinita, universal,

Desocupada de sua propriedade privada,

Despossuída de seu reduto sagrado,

Algoritmizada pelas ditaduras democráticas ideais.

Harém de unicórnios desierarquizado,

Multidão dividida em classes, horizontal,

Selvagens, nômades, líquidos

(Em busca do amor sólido),

Desidentidades identificadas

Com a pós-verdade de seus carnavais.

Tokenização, tolkienização,

Elfas fazendo suspensão,

Feiticeiros virtuais,

Que passam na timeline

Para nunca mais.

quarta-feira, 30 de setembro de 2020

CONVITE A CITERA

 

Nenê (ou irmã,

Como diria Baudelaire,

Mon – me desculpe o cliché

Frère!), marxista está no youtube.

Qualificando a tese,

Vamos criar um canal

De casal no Porn Hub?

quinta-feira, 3 de setembro de 2020

O fake do fake mimetiza a parrhêsia perdida,

A parúsia vendida, a verdade imiscuída

Em suas próteses, dispositivos, tecnologias.

Promiscuídas, as múltiplas faces

Tindérias, Tágides da rede,

Me prometem o Paraíso

Para o exercício de meu cinismo,

Sem que nenhum istmo ismo

Vanguardize ou preencha o abismo.

Parrhêsia, parúsia: paralisias.

domingo, 12 de abril de 2020

SEM TÍTULO (O ALCOVITEIRO DA MORTE)

O alcoviteiro da morte
Me convida para sair.
Covid, para onde ir?
Coronal, flanar
Sentindo a fosforescência
Do mal,
Como antigamente,
Com espaço para,
Mais detidamente,
Ser seduzido pelo viço
Da mercadoria que sobrou?
Ou, coronários, circular
Por caminhos desabitados,
A não ser
Pelo cimento e edifício
Do que ainda forma
Não tomou?
Flanar utopicamente,
Sem saber se o futuro
É solidário
Ou se, no Capitalismo
Ou no Socialismo,
Lutaremos
No apocalipse zumbi,
Que por ora o assisto
Na Netflix, aqui?
Ou contar os mortos
Que o desemprego já matou?
Alcoviteiro,
Outro filme me chama:
É sobre epidemia
E quarentena.
Tanta mise en abîme.
Uma pena. 

sexta-feira, 10 de abril de 2020

SEM TÍTULO (É UM TANTO TRISTE VER, SOLITÁRIAS,)

É um tanto triste ver, solitárias,
As teias das aranhas.
Seu esmero desperdiçado,
Detalhes espicaçados,
Insetos endurecidos,
Dispersos e não ingeridos.
Mas mais tristes
São as teias sem nem eles:
O trabalho e a beleza
Deixados como presentes
De artistas mortos
Ou misteriosamente evadidos.



terça-feira, 7 de abril de 2020

SEM TÍTULO (EM TONALIDADE DE ENLUADO LUTO,)

Em tonalidade de enluado luto,
Cuckquean atravessando a noite devassada
Por luzes entrefolhas penetrantes
Como chifres de fêmea unicórnio.
Córnea passante (a lua, a cuck),
Musicista do salto alto flautino
Esperando a faca de Chucky,
O brinquedo assassino... ainda quedo.
Queen of the stone age, primitiva,
Ou arcaicontemporânea como bélica
Kaiowá em Brasília, flecheira.
Os feixes de luz manipulam seu desejo:
Entrefolhas das janelas, das árvores,
Dos bares, bebendo o absinto
Da claridade bêbeda dos lares, a rainha
Passeia nas calçadas, nas aleias,
Como se sonhasse com sangue, sedenta,
Destilando aguardentes na boca,
E, mirando profundamente no imo
Do enlace das sombras, o inequívoco palor
De um poliamor vampiro.

sábado, 29 de fevereiro de 2020

SEM TÍTULO (AS IRMÃS DE COLEIRA)


As irmãs de coleira
Dividem a ração
E inspecionam o canil.
Decoraram a dissertação
De Luciene Galvão
Viana, e se excitam
Via perspectiva pós-estruturalista
De inspiração foucaultiana.
“Monogamia é tão démodé”,
Consta na descrição no FetLife,
Que ambas recitam mecanicamente
Como legenda em cada
Selfie, seja hard, seja mais light:
Em uma iniciativa meio rara,
Postam um reverse blowbang no Insta
Como propaganda do pack,
Para que o Dom compre
Uma ração mais cara.