sexta-feira, 24 de junho de 2016

SEM TÍTULO (UMA FORMIGA RUIVA DIRÁ, DIABA,)

Uma formiga ruiva dirá, diaba,
Que a vida queima em sua pele,
Que todo dia o Inferno desaba
Na labuta de suas costas,
Que nenhuma saevissima salvadora
Trouxera revolução ou boas novas
À sua sociedade ou completa imanência,
Lá na luta de algum bem e algum mal
Ou de classes guerrilhentas.
Suavíssima e diaba, ardendo
A lava-pés estanca, para
E lava as mãos.


segunda-feira, 13 de junho de 2016

SEM TÍTULO (A PELÍCULA DA VOZ TRANSPARECE UM POUCO:)

A película da voz transparece um pouco:
A imagem pelicana assume o calor do dia protegido no papo.
O devir-puta do rubro da flor do jardim da praça atiça
Uma forma inesperada de amor
Entre duas vozes um tanto desencontradas.
Um folículo de dúvida cresce na luz do vitral da igreja,
Mas logo abaixa: o dia ameno
Tudo ameniza, o sol tudo cresta maciamente,
Com malícia de padre bonachão.
Uma pomba petisca uma bolacha no chão.
Está envenenada.
Mas ninguém sabe.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

TRAVESSIA

Oxiúro, Deus-verme,
Fezes, pedras indígenas,
Urina, ouro na água,
Saliva, manto protetor,
Umidez do verbo núbil
Nas trevas do palato,
Tudo que seu corpo
Atravessa e expele
Como ritual,
Amorosamente ou com terror,
Tudo que ele decompõe
- Tudo depõe o fato
De que é sagrado,
E de que eu sou o iniciado
De tudo o que ele
Ainda esconde ou expõe. 

sexta-feira, 3 de junho de 2016

SEM TÍTULO (TRÊS AMIGAS CAMINHAM NAS RUAS.)

Três amigas caminham nas ruas.
Uma tem os cabelos azuis,
A outra, vermelhos, a outra, verdes.
A de cabelos azuis tem mechas vermelhas
E verdes, a de vermelhos, mechas azuis
E verdes, a de verdes, mechas azuis
E vermelhas, e costumam
Trocar de posição ao caminhar,
Costumam desacostumar suas posições
Ao lado umas das outras,
Até que suas cores jardinem nas ruas
Como se flores sorrissem
No compasso dos sons da cidade,
Mas até o ponto em que esse jardim
Chegue ao jardim da praça
E se sente em um banco
Para ser regado
Pelos filetes de luz amena
Que transpassam o corpo
De uma frondosa árvore sempre ali.
(O jardim da praça também sorri).