domingo, 24 de fevereiro de 2008

BELEZA INTRUSA

Azul êxul,
Húmil,
Noivado
No rincão
Do branco
Núbil.
Pincelada
De um céu
Por terminar.
Ou ainda,
Céu suave
Coberto de nuvens.
Esgar
De intrusa beleza
Que quer viver
Em excesso de luz.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

ALVO

A
Alvacenta
Alva senta
Na
Veneziana,
E desliza
Algodoada
Como uma gôndola
Veneziana.
Sou alvo.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

PRIMORDIAL

Adâmico olhar,
Singular
Nas entrelinhas.
A criança
Conserva
Algo do Éden.

sábado, 9 de fevereiro de 2008

A PONTE

Entre
A lida
E
O prazer,
A arte.
Assim,
Sempre
Licorosa transgressão
A ação
De elaborar
Sons,
Palavras.
Assim,
Ponte
A ponta
Do iceberg.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Às vezes, não pensar.
Ou melhor:
Pensar em termos de sensações.
Pensar,
Ou melhor,
Sentir
Que o suco de abacaxi
É de abacaxi.
Que existe abacaxi
No suco de abacaxi.
Sentir o abacaxi
No suco de abacaxi.
Sentir,
Ou melhor,
Viver,
Por um momento,
O abacaxi.
Viver:
Entregar-se ao mistério.
Ao mistério esparso.
Total e em porções.
Junto ao conhecimento,
O mistério.
Viver:
Conviver com o mistério.
um brasil
de
umbra
obumbra
a nascitura
alba
no umbral –
sem aval,
foge
a
penumbra
sepulcral,
num deslumbrar
de assombro
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
TORTURA MENTAL
Por vezes
Contra o dedo,
Palavra.

Por vezes
Contra o dedo,
O medo.

O fino brilho negro,
Vestígio do fogo das estrelas
Que se consome
Na sujeira do grafite.

Carvão sem tento,
Que tenta em vão
Marcar o mundo,
Mesmo aberto em não.

Se a palavra chama,
Atendo em paz.
Paz de quem dorme
Com arma em punho.
O corpo é luz
Que brilha em um abismo
E convida à possessão.
Mas a possessão é impossível –
A luz é muita.
É demais.
Impossível aproveitar tanta luz.
O contato dista,
Distante nele mesmo.
O corpo é ilha,
Mas que náufrago não quer deixar.
O corpo é fundo –
Abismo abismado no paladar.
O corpo supõe mistério.
É um chamado sem destino.
O corpo é mais.

NATAL

Se Jesus nasce, meu avô morre.
O que significa esta ironia?

MIRAGENS

Imagens como abutres
Aguardando a carniça,
Planam, sem trégua,
À altura da cabeça.
Imagens convocam imagens
Para, debalde, mitigar
O tormento das imagens.
Imagens disfarçadas de miragens.
Morrer: tornar-se imagem
- Escrava da memória,
Que escraviza a mente.
Tais miragens:
Imagens que miram a morte.

INSTANTÂNEO

Ejeta o jato
Que
Contorce-se quase como um c
E
Pousa
Metade no meio do cenho,
Metade no meio do seio.

GRACILIANO

A seca fala.

DEPENDENTE

De cinzas
A cinzas,
De pó
A pó,
Retornará
Às cinzas,
Ao pó.
Dar nó
No mundo:
Ofício só,
E de
Dar dó.

O DEPRAVADO COM CÁLCULO RENAL

Minha chuva não é de ouro...
É de cristal!
Suas palavras tinham câncer.
Sua frase desenvolveu metástase.
Os sorrisos são perigosos.
Eles quase dizem que não há problemas.
Eles quase dão prazer de viver.
Os sorrisos são propícios ao perdão.
Nem que somente dos olhos,
Os sorrisos podem mudar as pessoas.
Eles aliviam -
São perigosos.
Fazem leve carícia no canto dos lábios,
Enchem de vida, dão boas vindas.
São perigosos.
Parece que gostam de ser sorridos.
Olhos de resedá
Que rezam
Ao rés do meu ouvido
O seleto silêncio
Que eriça pêlos
Pelos cantos
Que contém ternura
Pelos cantos
Que cantam
Olhos de resedá

SER HISTÓRICO

Saber que estou inserido na História me causa pavor
Saber que sou um agente
Um ator...
O que fazer com o que foi
Como começar o após
Até onde dar o passo
Até onde vai a minha voz

CORPO

Estar preso ao corpo
Não poder ser nada além de corpo
Tudo passar pelo corpo
Incomoda
Mesmo dando prazer
Incomoda
Sentir-se corpo
Sentir o corpo
O próprio hálito
Incomoda
O odor de borracha, de silicone
Que às vezes se desprende
E que nem a poesia muito alivia
Porque até ela passa pelo corpo
Porque até o Além passa pelo corpo

POEMA PARA NIETZSCHE

Se Deus é linguagem,
A linguagem é Deus?

CONTEMPORANEIDADE

Socorro! Só corro!

CARNE

Carne:
Império do sal,
Que em gesto e som,
Tem fé na terra
E no céu.
Antes, semente.
Semente
De semente repleta.
Carne:
Substância saturada
De desejo.
É de fogo:
Queima;
Em prazer,
Imita vagas,
Vagando em til.
Carne:
Única presença
No vazio.
Sol que sua,
E soa.
Carne:
Dor, dormência.
Leito da morte,
Que desperta,
Sempre,
Num único levantar.
Carne:
Concentrado mar.
Aos borbotões,
Borboletas.
Cores voam.
Nanquim cria asas.
Ou pétalas voadoras.
Flores voam.
Os olhos borboleteiam
Um novo olhar nas coisas.
o i fere:
é grito agudo de dor
choro de carpideira
sofrimento árabe
agulha que incomoda até a alma das palavras
o pólen cai do sol
esboroa-se no céu
não nos atinge – transforma-se numa tinta espiritual!
pus divino e ideal como as estrelas:
dê-me uma doença que me cure

A ROSA

a musa dos corações que ainda contemplam
uma rainha apaixonada sem coroa
(mas com corola)
uma prostituta de luxo
(saudável como uma vida sem paixões)
- uma rosa é uma vagina bem cuidada

A POESIA

Enquanto prostituta,
Que trabalhe armada:
Gilete ou faca
(Nem que seja só lâmina).
Que não abaixe a cabeça,
Nem fique cega.
Que resista,
Discuta com os cafetões.
O preço é escolha própria,
Pois quem cobra também paga.