quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

UM BRAÇO


O estado moribundo
Em tantálica condição
- “No copo”, falava,
E nem a água entrava
- Foi o que deu vida
A um braço quebrado.
O que ali havia de vida
Não vicejava no resto deitado.
O braço recuperou a memória
Do cérebro desmemoriado;
Memória mais imaginada,
Entre o passado
E o espaço do nada.
O braço rejuvenesceu;
A pele áspera e fustigada
Foi bebê, menino e menina
Desesperada para sair do colo
E brincar;
Do colo colado
Do osso que estiolava.
Nenhum esquema de isquemia
Explica a vida
Daquele braço.
Do braço que ama e chora
Estando enfaixado...
Porque aquele braço,
Além de braço,
Foi a íntima e última possibilidade
De recontar a sua história.


terça-feira, 25 de dezembro de 2012


Meu desejo existe,
E o desejo da página
Que se mistura
Com o meu desejo.
Escrevo porque
O desejo insiste
E o desejo da página
Já é o composto
Que me assiste.
Passiva,
Sou o regulador
De sua geografia
Ínfima e vasta,
O tatuador
Desta body artist.
Pede agressão
E sou o estripador
Que depois
Brinca de necrópsia.
Ativa,
Sua passividade relativa
É o desejo de ceder
E de me refrear
(Tudo é ambíguo),
É o jogo que comporta
Na abertura gráfica
De mais de uma porta,
É sua inconsciência
Dotada da vida
Do meu inconsciente
Sempre vigilante
E presente,
É sua prisão
Que é a própria liberdade
Minha e sua:
Comunicação.
Esta necrópsia
É também uma autópsia,
Deus violento
Violando um deus,
Corpo não corporativo
De textura e paixão.
Caneta, bisturi, formão.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012


Odor de madressilva
Nos cabelos dela.
Dela de quem não se conhece.
Silvo de violeta,
Saraiva violenta
Nos olhos sem rosto... dela.
Não se conhece.
Paisagem e rosto
Sofrem agências.
Nem sempre
Uma vertigem de imanência
Apura ou cura uma metafísica
De amor.
Pois amo um rosto
Na paisagem,
Uma paisagem
No rosto,
Desconheço uma amada,
Rosto se expande,
Simultaneia, devém.
Paisagem idem.
Todavia há quem
Pressinta,
Jogando com a imanência,
Uma também ludico-misteriosa
Essência,
Aqui-além.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012


Brigitte Bardot,
Que tanto desejo bordô
Bordou nos meus sonhos
- Eu, um bebê foca -,
Conseguiu engolir algo maior
Que o ego de de Gaulle?
BB, “devoradora de homens”,
BB conservadora,
BB, sou um bardo brincalhão,
Bebê foca na esperança
De bizarra amamentação.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012


Prolapsias forçadas são estas flores,
Que parecem maceradas pelo azul do meu beijo:
Flor-hematoma do sonho e do desejo.
Qual o ensejo do lume desta blume?
O perigo do azul é que se confunde;
Ele se funde, pois tudo tem um toque azul.
Toda fusão desta espécie é uma eternidade,
Uma forma colórea de extrema-unção.
Estas flores prolápsias foram também forçadas
Nesta misticóide conversão?

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

IRACEMA


Lábios de mel,
Melados
Com um baba
Rapunzel,
E com outros
Melados
Mais doces
Escorrendo
No sorriso
De hiena
De quem,
Entretanto,
Já melou
Os lábios
Com iguaria
Obscena. 

terça-feira, 30 de outubro de 2012

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

PRINCÍPIO DA REALIDADE

Threesome,
Foursome,
Fivesome...
Mas na hora
Todo mundo
Some.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012


A criança...
A criança no claro-escuro
Da identidade.
Ressurgente,
Ressurreta pela via menos reta.
Mas não a criança trauma,
A criança édipa.
Antes na trama
Do cogito
À que não se cogita castração.
A criança...
A criança profanação;
Que entre o lúcido e o lúdico
Desconstrói o mundo
Como desconstrói um brinquedo:
(L)ego legado
Da imaginação.


quarta-feira, 10 de outubro de 2012


Escrevo
Porque está ausente.
E a ausência
Não me completa
Em sua plena
Opacidade.
A ausência
É o sentimento
Da pureza,
Como a página
Branca da verdade.
Mas o que se sente
Não se escreve
A não ser ausente
Na própria escritura
Que é saudade.
Ter você pela violência
Ou não
É uma questão
De gradação
Da palavra,
Que será sempre
O vigário
Do que é vicário.
Há muitas vozes,
E quanto mais vozes
Mais ouvidos moucos.
Perenidade
É só a ausência;
Só ela
Fundamenta
Uma presença
Onde a brancura
Não pode viver.
Escrever:
Rica precariedade.
   

sexta-feira, 5 de outubro de 2012


Todos os sons da musa;
Mais ainda os sutis,
Subterrâneos.
Vascularidades
Conforme viscosidades
Discordes
Acordem os acordes
Dos sons subcutâneos,
E os mais viscerais
Sem que haja
Derramamento de sangue;
Todavia que a orquestra
Das bordas
Esboroe o fetichismo
Das formas.
Duas costelas de baquetas
E um quadril
De tambor: o suficiente,
Desde que
A macabra dissonância
Seja percuciente
E o som
Não ensurdecedor.
Mas acaba sendo insistente.
O fetiche
Sempre assume
O papel de imperador,
Mesmo em meio a ruínas.
Antes fosse
Poema eterno de amor.   

Deixar se inscrever
Não só o que está escrito;
Prever só a sombra
Do que é dito;
Prevalecer a luz
Como condição
Sine qua non
De não subtrair
O proscrito:
Ditado de risco.
O rasgo obscuro
No rosto da página,
Esfinge pálida
Como se um cisto
Quisesse ser quisto.
Risco de poesia
Onde não houvesse,
Ou nas intermitências
De tudo que se dissesse.
O istmo
Do lúcido e do lúdico
Como a ponte
De uma máscara
À outra
Virando mão dupla
Das zonas
De luz e sombra,
A não ser a página cega,
Onde tudo se desintegra,
Onde tudo
- Luz e sombra -
Se nega. 

segunda-feira, 1 de outubro de 2012


Desde o exórdio
Desta mixórdia
Espiritual, quis
Ser o exorcista,
O fiel padre
Que, na espera
Das mais aretinosas
Poses não cedesse
À tentação
De casanovismo
Como no caso das irmãs
Também possuídas.
Fiel padre,
Papa-hóstia ideal...
Mas que no final,
Cansado do vômito
E dos giros do pescoço
A transformasse,
Sem de Satã
Desejar ser um dos corifeus,
Em pelo menos
Uma putinha de Deus.

terça-feira, 25 de setembro de 2012


Somente uma espécie de estupro salvaria
Desta estrela que infecciona seu olho.
Em uma mulher,
Consigo prever a textura
Das fezes conforme
O bater do dedo no copo.
Talvez o amor seja isto.
Provavelmente não...
O que fazer com esta estrela
Que infecciona seu olho?
Se permitisse uma violência
Que somente eu sei praticar,
Seria proveitoso para ambos.
Mas é tarde; seu olho
Já possui a beleza estúpida
De uma criança disforme
Imprecando contra Deus.
É tarde, é tarde...
Não posso com uma beleza estúpida
Na sublimação da madrugada.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012


Meu fluido desperta os mortos do desejo
Como miasmas perseguidores,
Atinge o órgão de granito
Das estátuas gregas, saliva em seus pés,
Corrói o que o tempo já corrói.
Odor, sabor, textura:
Meu fluido (se) altera tudo
No percurso...
Seu alvo é o mundo.
Sua corrosão fecunda,
Presentifica, progride,
Delineia, torna instantâneo.
É um espirro em espiral, uma vertigem,
Redemoinho, maremoto,
Hidra líquida que solidifica,
Origem em estado de amnésia,
Mistério totalizante,
Desmemoriado, que origina
Tudo desde sua origem
Monocausal que perde a causa.
A causa que desliza como cauda...
Lúdica criação
Em sombras lúcidas
Como (auto)bullying de fantasmas
Que doa sentido aos fenômenos.
Estátuas gregas, automóveis,
Humanos em diálogo,
Animais em instinto,
O que eu falo, o que eu sinto:
A tísica da metafísica,
A origem (em crise) que esparge a própria meta
Na mente humana
E em qualquer engrenagem.
O fluido corrói, fecunda, vivifica
E ao mesmo tempo mata
Para procurar a origem mais profunda.
Tudo é sagrado quando há a busca,
Pois tudo é sagrado quando o homem (se) funda.   

sexta-feira, 20 de julho de 2012


A vida é teatro
Que alguns dizem de máquina.
Eu digo de carne,
Teratológico, com o vício visceral
Da máscara exposed.
Mas é verdade que a máquina expõe.
Suponha que ouse
Uma musa de Chernobyl,
Repasto de câncer
Que nenhum médico viu,
Que o charme monstruoso
Do elefante assumiu,
Clitóris duplo com pênis no meio,
Infecundo, arabesco mal feito
No bico do único
Ou do terceiro seio,
Selo de garantia
De que Deus também é grosseiro
E de que no meio do belo
Sempre medra o que é feio,
Ânus com boca e olho saltado,
Nariz deslocado, membro com multiplicidade,
Alguém dirá o corpo legítimo
Da pós-modernidade;
Ausência de órgãos, caos errante
(Talvez eu, anacrônico, dissesse:
Tristeza hiante),
A musa de Chernobyl,
Na seção eating shit,
Seria alcunhada Chernobitch.